sábado, 27 de junho de 2009

Isto NÃO é um diálogo

Fernanda da Costa
Guilherme Cruz



(Ilustração: Aristides H. Ares - Cuba)


PERSONAGEM Asterisco (*):

Vocês sabe me dizer o que é arte?


PERSONAGEM Sustenido (#):

O questionamento sobre o que é arte é estritamente contemporâneo. O motivo pode ser justificado por duas vias argumentativas: uma, porque a arte estava muito bem delimitada, e outra, porque a sociedade não parou para fazer este questionamento.


PERSONAGEM Diapasão (v):

Ficamos com a primeira, dado que desde Platão e Aristóteles a filosofia discute a arte...


Asterisco (*):

Então, acontece que a arte não está mais delimitada? É isso? E desde quando?


Diapasão (v):

Desde o século XX. E quem quiser saber mais que pergunte ao Hegel...


Asterisco (*):

Eu não! Você olhou a foto do link? Cara de poucos amigos...


Sustenido (#) mostrando leve irritação no rosto devido a uma veia azul latejante logo abaixo do olho esquerdo:

Acontece que O MODERNISMO mudou a história e o conceito de arte. Duchamp mijou pela última vez no urinol, levou-o ao museu e disse que é arte. E é arte, porque a arte é conceitual. Não é o cachimbo, entende, é a IDÉIA do cachimbo, o conceito, meus caros!


(*):

Não seria o contexto?


(v):

Contexto? Ah, quem falou em contexto é o Nelson...


(*) interrompe a fala do (v):

Rodrigues?


(#) rindo muito. Nota-se que a veia antes latente acalma-se em compasso lento até cessar:

Esse disse que elas gostam de apanhar! Vai ver foi o Gonçalves...


(*), sério:

Esse previu a volta do boêmio!


(v):

Goodman porra! Foi o Goodman que falou de contexto. Aliás essa pergunta pra ele é uma babaquice, entende? - “O que é arte”? Goodman a reformula e nos coloca em outro patamar. Para ele deveríamos é estar nos perguntando “Quando há arte?”.


Asterisco (*):

E quando há arte?


Diapasão (v):

Depende do contexto.


Sustenido (#) se dirige ao Asterisco (*) e pergunta:

A volta do Boêmio pra ti é arte?


Asterisco (*) responde desconfiado:

É... E Elas gostam de apanhar é arte pra ti?


(#):

Com certeza!


(v):

Viu, e quem disse isso foi o Danto.


(*):

Disse o quê?


(v):

Que para um objeto ser qualificado como arte, ele deverá ser interpretado.


(*) feliz:

Então, se a pergunta “o que é arte” não tem resposta, vou de Goodman e vou reformulá-la. Para vocês, quando há arte?


(#) irritado e com a veia voltando a latejar:

Com certeza não é quando fazem um texto em forma de diálogo e dizem que é uma reportagem sobre arte!


(v):

Se o que importa é a idéia de reportagem, a forma é o conteúdo e o conteúdo é a forma.


PERSONAGEM Sustenido (#) sofre uma parada cardíaca e é levado ao hospital. Na sala de espera o PERSONAGEM Asterisco(*) escuta “E os outros que se danem” no seu MP3 enquanto o PERSONAGEM Diapasão (v) lê “Estética Doméstica”.


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